04 novembro 2008

et voilá

Os velhos, muito velhos, aqueles que têm filhos e netos e às vezes bisnetos e tudo, fazem parte de um cenário antiquado. Vivem em casas velhas e frias e escuras, com cozinhas velhas, cheias de naperons, castanhas ou brancas mas ainda assim com pouca luz, fogões com os quais mais ninguém sabe trabalhar, pratos de alumínio ou pelo menos travessas de alumínio e uns talheres que ninguém sabe de onde poderão ter vindo, as suas salas são também escuras e cheias de louças antigas (e louceiros) e mais naperons, e rendas por todo o lado, e sofás do antigamente, às vezes um piano, velho, preto, desafinado, mobílias escuras e mais rendas nas cortinas, e bibelots por todo o lado, e fotografias, muitas fotografias.
E quando um dia os velhos se revoltam, viram a casa de pernas para o ar, compram mobílias modernas e deitam fora os naperons e as cortinas, deixam de viver em casas escuras e se envolvem em cores claras, deixam de ser tão velhos assim de repente, e parecem mais alegres e vivos, e fazem os novos invejar-lhes o tempo livre e as casas brilhantes de tectos altos, e o piano (já afinado) e as chávenas de chá tão bonitas que foram para o lixo sem dó nem piedade, e invejam a liberdade de passar a ser outra pessoa, sem deixar de ser quem se é.
Quando vejo isto fico a pensar se um dia serei a velha da casa (velha) castanha e escura, ou a velha da casa (velha mas renovada) colorida que de vez em quando deita tudo fora mesmo que no fundo pense que se calhar já só vai viver poucos anos e poderá não usufruir das coisas suficientemente. E daí, sei lá se chego a velha.

1 comentário:

  1. O mais provável é teres tempo que chegue e sobre para usufruir tudo convenientemente, e mais ainda!

    O Obama já apontou a direcção: havemos de chegar todos aos 106 anos...
    ;-)

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