27 julho 2014

A minha praia



Encaro as férias como morar temporariamente noutro sítio - porque não gosto de mudanças. Ficar mais que alguns dias num lugar tem que ter uma aparência de permanência. Crio rapidamente hábitos, gosto da familiariedade. Não sinto necessidade de estar sempre a experimentar coisas novas. Sei que gosto muito do meu café com leite, sumo de laranja e torrada de manhã, não quero trocar por salmão fumado, champanhe  e tostas. Ou outra coisa qualquer. Se experimentar um restaurante novo e gostar, volto lá vezes sem conta. Gosto da minha praia. Conheço muitas outras, já fui frequentadora habitual, ano após ano, de mais que uma, ao longo da costa, mas agora, esta é a minha. Escolhida por mim, mesmo nos anos em que ia de férias para outros lados, era a esta que eu vinha parar uma e outra vez. Há coisas a que não há como escapar.
Dou um passeio ao longo de outras praias, observo a quantidade de gente, os comportamentos dos frequentadores, as ondas, as rochas, o tipo de pedras e conchinhas, se e quando tem algas. A minha praia é melhor, fico por lá. Sei quem é o nadador salvador, converso com a senhora do bar, conheço todos os vendedores de bolas de berlim e os seus pregões e forma de andar. Os vizinhos das manhãs, são sempre os mesmos, ano após ano. Reformados, compraram apartamentos à beira-mar, e voltam à terra deles só quando precisam de tratar de alguma burocracia. Ou então de uma consulta, sintoma do estado do país, quando se têm que fazer 300 quilómetros para ir ao médico. Abro a tabela de marés religiosamente, gosto de estar a par das marés, alta e baixa, e das alturas respectivas. Interesso-me pela previsão da actividade piscícola. Sei até onde vai a água quando a maré alta chega aos 3,4m e que, quando chega aos 3,9m, quase não há espaço para toalhas. Quando a maré baixa até aos 0,4m as rochas estão o mais descobertas possível, e isto acontece, no máximo dois dias por mês. Pela lua cheia os peixes ficam doidos, andam em cardumes quase à superfície, vêem-se-lhes as bocas a tentar apanhar não sei bem quê. Os maiores, mais sagazes, nadam mais fundo. As gaivotas deliciam-se com a pescaria fácil. As mais jovens comem até não conseguirem levantar vôo.
Há falésias lindas, em risco de cair, sinais que indicam perigo, olimpicamente ignorados por algumas pessoas. Numa zona, fazem quase um círculo, onde adolescentes jogam vólei ao fim da tarde. Noutra zona, as falésias desenham uma baía, cortam as ondas, criam uma zona de calmaria, quase um lago. Aí ancoram veleiros e barcos a motor dias inteiros, tornando-se parte da paisagem.
Na época balnear, os serviços de praia fecham às sete da tarde. Na verdade, tudo tem horário, e nem é preciso relógio para saber as horas na minha praia. Perto do meio dia a maioria das pessoas vai embora. Pelas quatro chegam outras. Há poucos que venham de manhã e regressem à tarde. Alguns chegam pelo meio dia e abalam pelas quatro ou cinco horas. Pelas seis, a praia começa a esvaziar, e às sete já fica muito pouca gente. Depois das sete, por vezes, aparece um ou outro cão, apesar de proibido. Às oito e meia, quando a praia já está toda à sombra e o sol prestes a pôr-se, vão embora os últimos entusiastas. Amanhã há mais.

5 comentários:

  1. Gostei muito do texto...
    (aposto que a vontade de ir embora - que escreveste no post anterior - passa quando estas na praia)

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  2. Obrigada, Rui.
    A vontade de ir embora passa depressa. É substituída pela vontade de pedir ajuda, que eu não sou de ferro. ;-)

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  3. uau, que descrição tão fixe. eu passei três dias em cabanas de tavira no início de agosto e deleciei-me por a água este ano não ter estado aquela banheira morna. Eu prefiro muito mais a água fresquinha. Mas ali é sempre bom porque não há ondas. E apanhei montes de conchinhas para trazer de lembrança!
    Ah e depois passei duas semanas no norte, inclusive em trás-os -montes e convivi com uma data de emigrantes - se não fossem eles , aquelas aldeias era uma desgraça desértica. (obrigada pela dica da Quinta dos Castanheiros, fiquei lá 5 noites! só não usei o spa e os passeios de cavalos e charretes, mas fartei-me de passear e na piscina e dormi regalada sem um único barulho, o que é maravilhoso; antes dessa estive em outra casa, na região de amarante e fui às fisgas do ermelo e se nunca foste, quando voltares para aqueles lados, é muito giro para ir com crianças e tudo!)

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    1. Fantástico, ainda bem que gostaste (da Quinta dos Castanheiros e do post). :)
      Nunca fui às fisgas do ermelo, hei-de arranjar tempo para lá ir.

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