A minha filha guarda tudo o que apanha. A mochila da escola tem, além de livros e porta-lápis, bilhetinhos, bonequinhos, pauzinhos, berlindes, pedras. Sim, pedras, folhas de árvores, flores selvagens. Tudo. Às vezes pergunto-lhe quantos tijolos leva ali. Muitos, concerteza. Quando era miúda, eu gostava de investigar a carteira da minha mãe, descobrir o que é que ela guardava ali. Hoje em dia descubro tesouros na mochila da minha filha.
No fundo acho que ela anda a treinar para quando for velhota. Nunca se sabe o que uma velhota pode ter na carteira. Pode ser um porta-moedas. Pode ser um tijolo.
Há muitos anos, vivi durante uns meses em casa da avó. Os meus amigos vinham estudar para os exames comigo, e a avó fazia de avó de todos, dava-nos de lanchar, e tinha uma paciência imensa para nós. A avó era muito engraçada e bem disposta, e nós gostávamos de estar com ela, sem verdadeiros adultos por perto. Sim, que apesar de já todos termos idade para votar, ainda éramos umas crianças.
Um dia, andava a avó a passear na rua, às compras talvez, ou a tratar da vida dela, e um dos meus amigos encontrou-a. Tendo-a reconhecido pelas costas, aproximou-se para a cumprimentar, tocando-lhe ao de leve no cotovelo. A avó, que não estava a contar que alguém a abordasse dessa forma, assumiu que algum malandro estava a tentar assaltá-la. Instintivamente, usou carteira para lhe dar uma valente traulitada. Só depois de o meu amigo estar K.O. é que a avó se apercebeu do mal-entendido, desfazendo-se em desculpas. O meu amigo nunca mais abordou nenhuma velhota conhecida pelas costas.
Uma outra velhota, também há muitos anos atrás, seguia a sua vidinha, rua acima, pela manhã. Azar dos azares, passa um tipo numa mota, e arranca-lhe a mala por esticão. A velhota caiu ao chão, e alguém que viu a cena correu para a acudir. Ao chegar à beira da senhora, esta ria-se como uma perdida, e estava com dificuldade em falar, de tanto de rir. A senhora estava um bocadinho dorida, nada de especial, e lá explicou o que tinha tanta graça em ser assaltada. Ó menina, dizia a velhota, o assaltante nem imagina o que leva naquela mala. O porta-moedas trago-o por dentro da camisola. Na mala tinha uma amostra de urina para análise.
As carteiras das velhotas, uma caixinha de surpresas.
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